23.4.11

27 - os mágicos



Lev Grossman
Começa bem, com um adolescente sobredotado chamado Quentin, super sorumbático, alto e magro, mas com os ombros descaídos, como se se estivesse sempre a abraçar para se proteger de um qualquer golpe vindo dos céus e que, logicamente, atingiria primeira as pessoas mais altas. Quentin tem como amigos outros dois adolescentes sobredotados, um rapaz e uma rapariga. Como em qualquer outro triângulo, também neste as arestas estavam todas ligadas de alguma forma, com Quentin apaixonado por Júlia, que por sua vez namorava com James, Mesmo entre os sobredotados, o panorama das emoções é surpreendentemente previsível. Quentin divide a sua vida entre dois mundos. O real, onde se move embaraçado sentido-se um figurante de segunda linha e um outro, mágico, tirado de uma série de livros que leu na infância, um mundo chamado Fillory mas que é chapadinho (ao ponto do plágio, digo eu) de Narnia. Estes livros contam a história de cinco crianças inglesas que se refugiam no campo para fugir da primeira guerra mundial, onde está o seu pai. Dirão os puristas que logo aqui há diferenças consideráveis, visto que em Narnia são apenas quatro crianças inglesas que se refugiam no campo para fugir da Segunda guerra mundial, onde está o seu pai. E, enquanto a Narnia se acedia por um roupeiro, a Fillory é por um relógio, daqueles tipo Big Ben, mas em miniatura...Super diferente. Percebe-se no entanto facilmente o encanto que Fillory suscita em Quentin. Em Fillory, existe um eclipse todos os dias ao meio dia (que é quando os eclipses se vêem melhor) e as estações, principalmente a Primavera, podem durar mais de cem anos. Em Fillory, mares de um verde pálido acabam em praias pequenas feitas de conchas partidas e as árvores secas não têm vergonha de se recortar contra o céu, arranhando-o Em Fillory, as coisas contam de uma maneira que não acontece no mundo real, e consegue sentir-se as emoções adequadas ao que quer que seja que nos está a acontecer. A felicidade é uma condição concreta a alcançável e vem quando é chamada. Melhor ainda, nunca sequer te chega a deixar. Fillory é brutal. Mas chega de Fillory. Detesto sítios felizes.

Quentin tem dezassete anos e está em vias de entrar para a faculdade, Princeton, mais concretamente, mas um dia desorienta-se e dá por si em Brakebills, a Faculdade dos Mágicos, onde depois de Ter sido examinado (e este exame é muito fixe, porque os examinandos tem que descrever um sítio que não conhecem e que não existe numa língua inventada por eles naquele momento, que no entanto tem que ser suficientemente madura para lhes permitir criar ali mesmo o sistema judicial do tal lugar inventado) poderão seguir uma carreira de mágicos. Quentin, a quem a sua vida quotidiana parecia um papel secundária de um filme de má qualidade, perante a oferta de uma vida como mágico, fez o que qualquer um de nós faria: aceitou. Brakebills não é Hogwarths, embora as semelhanças sejam mais que muitas, não tão plagiantes, desta vez.. Digamos que Brakebills está para Hogwarths como a Faculdade está para o liceu. Em Brakebills fuma-se, bebe-se, segrega-se os outros, anda-se à pancada e faz-se sexo, nem sempre de uma forma heterossexual. Quentin lá se integra e de alguma forma perde o entusiasmo e a inocência com que aceitou a vida de mágico provavelmente, digo eu, porque emparelhou com Elliot, o Oscar Wilde lá da zona e também porque todas as noites se alcoolizava com alguma intensidade. Ainda não falei de Alice, uma espécie de Hermione (lá estou eu), mas, como direi... papável... Várias coisas interessantes acontecem em Brakebills, e esta á a parte mais fixe do livro. Um dia, durante uma aula interminável, um ser de outro mundo toma conta da aula e prolonga-a por mais de dois dias, fazendo que toda a gente desmaie de caimbras quando finalmente se vai embora, depois de comer a única estudante que o tentou parar. Outro dia, todos os alunos finalistas tiveram que subir para o telhado e despir-se, deixando que o sol do fim da tarde lhes brilhasse na pele. Para, logo a seguir, serem transformados em gansos e voarem até ao pólo sul, onde existe uma filial de Brakebills onde eles iriam receber a parte mais difícil da sua educação enquanto mágicos. Ou o facto de, numa tentativa de prolongar a Primavera e o Verão, os responsáveis do colégio terem baralhado o calendário de tal maneira que, em Brakebills, o tempo andar sempre dois ou três meses atrasado. Ou o exame final, em que cada aluno pode escolher o tema, em que Alice decidiu aprisionar um fotão e Quentin decidiu ir à lua, quase o conseguindo. Ou, depois da festa de formação, quando o director levou os finalistas para o único sítio da escola onde os feitiços protectores não funcionavam e, depois de os embebedar, lhes meteu um demónio dentro das costas, para as guardar e depois lhes tatuou uma estrela em cima. Enfim... tudo o que é bom acaba e Quentin, Alice e os outros passam instantaneamente a viver em Manhatan, onde se dedicam ao mais completo hedonismo sem sentido, com excepção de Alice, que continua a estudar. Quentin, entretanto, cede aos encantos de um trio, com Janet e com o Oscar Wilde, sendo apanhado por Alice, com quem namorava, logo a seguir ao trissexo. Alice, tal como eu e mais alguém, não gostava de trios, e reagiu muito mal a esta traição, acabando depois por fazer sexo com um punk de crista verde que também era mágico. Como se pode ver, o período pós Brakebills foi uma autentica estupidez literária, por isso o autor resolveu fugir para a frente e, depois de terem descoberto um botão mágico, eis que vão todos para Fillory, que afinal existe. E é aqui que começam os disparates. De repente, vindos do nada e sem sentido nenhum, aparecem coelhos gigantes e furões a tentar matá-los a todos, árvores com relógios, fontes e praças e edifícios esquisitos dos quais não percebi a descrição, o papel e a lógica, mais animais assassinos, centauros que pinam com cavalos, viagens de barco, um cavalo que satisfaz os desejos... E Quentin e Alice e os outros lá no meio, numa missão que não percebemos qual é mas que, em rigor da coerência, eles também não. Entre as várias vezes que fui adormecendo e acordando nesta parte (e poderá ser um bocadinho por isso que a coisa não resultou lá muito lógica para mim) fixei apenas o seguinte: o mau era Martin Chatwin, o mais velho dos cinco irmãos. A boa era Jane Chatwin, que tentava combater o irmão. O objectivo dos dois era ficar em Fillory. E, no que a mim me diz respeito, palavra que não percebo porquê.