29.11.14

72 - o passageiro













Jean Christophe Grangé
Já estou farto deste homem. o problema é que todos os livros são bons e assim não há forma de evitar. Desta vez é meeeeesmo complicado. Começa com um psiquiatra que investiga um paciente que está ligado a um crime em que mataram um sem abrigo e o minotaurizaram, ou seja, para os menos familiarizados com esta operação, enfiaram-lhe uma cabeça de touro pela cabeça (dele) abaixo. O psiquiatra vai tratando o paciente até que, entre outros pormenores, dá uma cabeçada na parede e lembra-se que afinal não é um psiquiatra mas sim um sem abrigo mesmo pobre. E vai daí e lança-se no meio dos sem abrigo a fazer pouco mais que ver os outros sem abrigo a beber embalagens cartonadas de vinho, que parece ser a sua principal actividade. Bem, não quero falar nos arrepios na espinha que me deu as descrições da vida dos sem abrigo, da violência entre eles, da luta contra o vento, contra o frio, contra quem os quer ajudar, e tudo para poderem beber o máximo de embalagens cartonadas de vinho. É demasiado verosímil... No meio das suas voltas, descobre um outro sem abrigo que foi morto e depois icarizado, ou seja, para os menos familiarizados com a expressão, enfiaram-lhe umas asas pelos braços dentro. E vai daí, o sem abrigo, que note-se, ao voltar a ser sem abrigo lembra-se de ter sido psiquiatra no futuro,  ao fugir da polícia, dá uma cabeçada na parede e lembra-se que afinal é um pintor louco que apenas pintava auto-retratos seus a encarnar personagens diferentes. Enquanto pintor, lembra-se de ter sido sem abrigo e psiquiatra no futuro, e descobre um outro sem abrigo que foi morto e depois urbanizado, ou seja e para os menos familiarizados com a expressão, desta vez não lhe enfiaram nada, ou melhor, enfiaram-lhe a própria pila depois de lha terem cortado. O pintor descobre isto e depois dá uma cabeçada na parede e descobre que afinal é um playboy qualquer que tem montes de sucesso com as mulheres e cuja actividade principal era falsificar documentos. E depois já não me lembro se houve outro assassínio mitológico ou não (às vezes o sono vence a leitura) mas ainda me lembro de haver mais uma cabeçada na parede e o falsificador fazer o eterno retorno nietcshiziano e tornar a ser um psiquiatra, que se lembrava de ter sido pintor, que se lembrava de ter sido sem abrigo, que se lembrava de ter sido psiquiatra. Portanto, se eu fosse mais pragmático, resumia o livro assim: era uma vez um psiquiatra que tomou umas drogas e teve um episódio psicótico amnésico e se transformou num falsificador, e depois teve outro e transformou-se num pintor louco, e depois teve outro e transformou-se num sem abrigo e depois teve outro e transformou-se noutro psiquiatra diferente. E depois começou a investigar um caso parecido e descobriu um assassínio mitológico e lembrou-se que afinal era um sem abrigo, e descobriu outro assassínio mitológico e lembrou-se que afinal era um pintor, e descobriu outro assassínio mitológico e descobriu que afinal era um falsificador, e já não me lembro se descobriu ainda mais um assassínio mitológico e lembrou-se que afinal era um psiquiatra. Cansativo, este livro....

71 - edge of tomorrow












edge of tomorrow
Mais uma vez, a terra foi invadida por extra-terrestres que deram cabo de 95% de nós em meia dúzia de horas e, curiosamente, fizeram o que todos os extra-terrestres fazem nestas ocasiões. Pouparam os americanos, que se disfarçaram de ingleses e fizeram uma espécie de recreação do Dia D. Assim sendo, desembarcaram  outra vez na Normandia e atacaram de dentes cerrados e olhos fechados, os extra-terrestres que tinham, efectivamente ar de alemães. A partir daí, o filme torna-se interactivo, e o espectador é tragado para dentro da televisão e é-lhe oferecida a possibilidade de comandar uma das personagens do filme e assim ser o responsável pela sua evolução. Não resisti ao desafio e assumi constantemente o papel de Tom (Cruise), uma vez que desde miúdo que invejei o casaco (e o corte de cabelo)que ele usou no Top Gun. Tornei-me assim um oficial renegado que queria recuperar a honra salvando o mundo. E tive algumas surpresas: era bués de baixinho, a heroína não queria nada comigo e o jogo não corria nada bem. Saltei doo avi\ao e morri. Recomecei o jogo e morriquando aterrei. Recomecei  o jogo e morri mais à frente, atropelado. Recomecei o jogo e morri porque caí do penhasco. Recomecei o jogo e morri vítima de fogo amigo. Recomecei o jogo e fui atropelado novamente, desta vez por uma espécie de tanque, morrendo imediatamente. Recomecei o jogo e morri levando com os esroços de um avião que explodiu nos cornos. Recomecei o jogo e... ainda lá estou...

23.11.14

70 - Transformers, Age of extinction












transformers - age of extinction
Via esta série quando era criança e já nessa altura não achava piada nenhuma. Modesto como era, entretanto, e como já sabia mais inglês que a maioria das crianças da minha idade, desconfiava que aquele refrão da canção podia ser verdade e que havia naqueles desenhos animados mais do que à primeira vista parecia... Deve ter sido por isso que vi os filmes, à medida que foram aparecendo. Eis as idéias fortes que me ficaram do conjunto dos filmes todos desta saga:
- Adormeci em todos.
- Várias vezes em cada um.
- Os heróis humanos de cada filme são do mais pueril que a americanidade já criou.
- Os transformers transformam-se tão depressa que eu não consigo seguir com a vista.
- Até dá a impressão que é de propósito para não terem que programar os movimentos todos.
- Não há história.
- Os robots nunca são os mesmos.
- Os carros/camiões/outras máquinas que eles são enquanto civis também nunca são os mesmos.
- No último havia transformers dinossauros.
- Foram todos uma seca.
- Não os vou rever.
- Só em caso de insónia. 

69 - Coherence













De quando em quando, há sempre um bom motivo para praticar aquilo que eu acho que, quando bem usado, pode ser uma autêntica obra de arte literária. O aforismo, a punch line, aquela frase curta demolidora que diz mais em meia dúzia de palavras do que muitos tratados infinitos. Aquela articulação entre ideias e palavras única, que permite que o receptor comungue completamente da mensagem quase que mais por uma espécie de osmose literária do que propriamente por exercício da leitura. Vou tentar usar isso daqui para a frente, para filmes que não me dizem nada em especial, mas que no entanto merecem o registo de os ter visto, quer para os tentar recuperar no futuro, quando for mais inteligente, quer para não correr o risco de os ir ver outra vez. Assim sendo, como resumir em poucas palavras um filme que trata de um grupo de pretensos militantes do bom gosto, que falam com aquela entoação insuportável que o Woody Allen usava quando entrava nos seus próprios filmes, um filme em que acontece um daqueles jantares em que a principal preocupação dos personagens é fazer o vinho rodar dentro dos seus copos tipo balão mas de pé alto? E que depois, para piorar tudo, a casa onde este insuportável jantar decorre é duplicada por acção de um cometa que vai a passar e que provoca um qualquer efeito de multiplicação de coisas aborrecidas ? Que frase poderá caracterizar este exercício de cinema infeliz e enganador, que tem um sete no imdb ? Íman para críticos pretensiosos ?  Coerência do aborrecimento ? Melancholia sem actores de jeito ? Claramente, ainda não domino esta arte da frase curta. Se pudesse começar este texto outra vez e tivesse que descrever este filme, agora sem pretensão intelectualista da minha parte, diria qualquer coisa como: é tipo os amigos de Alex em que a única emoção humana que exploraram foi o aborrecimento e em que puseram as culpas num cometa que ía a passar...